Você não tem obrigação de ser feliz. Seja feliz só se você quiser.
E basta você querer, isso não é maravilhoso?
Fui convidada por uma amiga a participar de um kirtan na praia do Arpoador, durante o amanhecer. Fui mais para viver uma nova experiência. Participar para saber se gosto. Não ir por preguiça de acordar cedo não faz muito o meu estilo. Gosto de aproveitar o dia, amo a natureza, vejo beleza em cada fiapo de grama arrepiada, em cada pássaro a planar, em cada gota da extensa onda do mar. Então, lá fui eu de coração aberto.
Agradecer a dádiva de estar vivo para mim é isto. É aproveitar a vida ao máximo, em cada um de seus detalhes. E essa experiência de estar ao lado de pessoas que também amam viver e sentem a felicidade de ter mais um dia de presente foi maravilhosa.
Agradecer a dádiva de estar vivo para mim é isto. É aproveitar a vida ao máximo, em cada um de seus detalhes. E essa experiência de estar ao lado de pessoas que também amam viver e sentem a felicidade de ter mais um dia de presente foi maravilhosa.
Acordei às 5h da madrugada, aprontei-me e atravessamos a ponte, rumo à praia inspiradora. Ao chegar, nos dirigimos ao topo de um pequeno monte. Depois de tirar algumas fotos reverenciando a paisagem, sentamo-nos em círculo. E eu lá estava para ver, ouvir, sentir o que viria. Só sabia que um grupo praticante de yôga e hinduísmo recitaria alguns mantras.
O namorado da minha amiga, músico e guru, acompanhado de outro músico e professor de yôga, pegaram seus instrumentos e começaram os cânticos, enquanto o dia amanhecia. Em princípio, estranhei o primeiro mantra. Embora estivesse achando relaxante e delicioso, as palavras me soavam emboladas, estranhas. Todos começaram a cantar juntos naquela língua estrangeira e não me senti em condições de cantar junto, embora eu também goste muito de cantar. No segundo mantra, comecei a me deixar levar. Fechei os olhos e fui levada para além de mim mesma. Comecei a cantar junto aquela letra que se repetia inúmeras vezes e era agora mais fácil pronunciar aquelas palavras que ecoavam.
Antes de cada mantra que se iniciava, o mestre explicava do que se tratava, qual seria o sentido devocional daquela expressão. Cantávamos juntos, fechávamos os olhos e mergulhávamos em nós mesmos. Eu sentia a brisa passando suavemente pela minha pele, ouvia o som do mar, as ondas que iam e vinham, o gorjear dos pássaros, os doces acordes daqueles dois violões, as vozes que cantavam suaves como carícias aos meus ouvidos. Parecia um coral treinado, como se antes houvesse ensaio. Mas onde estava o maestro? Uma luz divina se fazia ali presente. O maestro era Deus. Em qualquer das crenças de quem estivesse ali naquele momento. Não importa. Algo maior que nós era sentido. Para tudo fazer sentido.
A sensação da alegria de viver se intensificava para mim. Uma felicidade sublime tomava conta do meu ser. Às vezes, abria os olhos e olhava à minha volta para admirar a beleza daquela paisagem encantadora. Do meu lado direito, o sol que chegava, refletindo no mar; do meu lado esquerdo, os surfistas que remavam à espera da próxima onda, na mesma sintonia que nós, meditando eles também a sua maneira. Fechava os olhos novamente e minha mente navegava às profundezas do meu ser. E tive algumas revelações, algumas das quais aqui compartilho com meu leitor.
Em determinado momento, minha amiga me disse: “- Gi, este mantra que vamos recitar agora é de devoção à uma deidade que destrói tudo que o for ruim de sua vida. Pense no que houver de mal em sua vida que você queira que seja destruído.” Então, o meu primeiro pensamento foi: “Mas eu não tenho nada de ruim em minha vida”. Entretanto, eu nada disse. Parei e pensei, quis refletir melhor sobre o assunto: “Que estranho. Será que não há mesmo nada de ruim na minha vida? Isso não seria presunçoso?” Fiquei pensativa por alguns momentos, até que compreendi que tudo o que havia de ruim eu havia deixado para trás. Estava agora no passado. E como eu só tenho o momento presente, vejo que, graças a uma dádiva divina, o meu presente é repleto de paz e amor. E, principalmente, cheguei a uma profunda compreensão sobre o meu passado: a percepção de que eu não vivi nenhum sofrimento sem propósito. Toda a minha dor teve a sua razão de ser. Tudo teve um motivo e um porquê. E tudo tem o seu tempo e a sua hora.
Sou muito grata a Deus pela benção que é conseguir aprender com cada dor. Há aqueles que se entregam à dor. Há aqueles que alimentam a mágoa ou o rancor. Há aqueles que se julgam infelizes por terem passado por grandes sofrimentos. E há aqueles que vivem o sofrimento a seu tempo, acreditam e lutam por sua superação e, uma vez tendo superado, enxergam nele a oportunidade que tiveram de crescer. Estes vêem a mudança interior ocorrida. Buscar o crescimento espiritual, tornar-se uma pessoa melhor, para si e para o mundo, é sempre o ideal de quem pensa assim.
Eu não mudaria uma única página da minha linda história, porque ela me trouxe até aqui, desta forma como estou hoje - plena e tranquila. Lembro-me que em Saint-Exupéry, a flor disse ao Pequeno Príncipe: “- É preciso que eu suporte duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas”. Assim é a flor: linda e delicada, precisa suportar as lagartas caminhando pelo seu “corpo” - suas pétalas -, retirando pedacinhos de si, que depois serão recompostos, mas não sem cicatrizes. Vem o inseto daninho e faz mal à florzinha. Embora de aparência frágil e delicada, a flor precisa suportar a má fase ou não terá a oportunidade de ver a chegada das borboletas, que coloridas e dançantes, pousarão suavemente sobre suas pétalas reconstruídas. Farão cócegas em seu caule, colherão o seu pólen, darão sentido e continuidade à sua existência. A vida terrena tem seu eterno ciclo de dor e alegria, é preciso aceitá-lo e compreendê-lo. A flor, com a sabedoria da natureza, resistirá às larvas e saudará a chegada das borboletas, compreendendo o ciclo da vida e celebrando a alegria de viver. Se desprovida de tal sabedoria, a flor sucumbe aos ataques das larvas, seja murchando e morrendo em definitivo, seja se fechando para a alegria da vida, sequer percebendo quando chegam as borboletas, ou, até, ao notar sua chegada, sequer a aprecia. Vendo o bater de asas coloridas ritmando pelos ares, não consegue apreciar a sua beleza nem festejar, pois não se regozija. Triste sim a sina desta flor. Não pelo que passou, mas porque não soube suportar e superar. Assim também somos nós. A felicidade depende, basicamente, da forma como encaramos a existência.
Ainda em meditação, comecei a fazer um passeio pelas minhas frustrações passadas. Pensei nas pessoas que me causaram algum mal, lembrei das dores sentidas, pensei nas situações que me afligiram, lembrei-me das vezes em que me senti fraca. E pedi que aquela Deusa destruísse não as coisas ruins existentes (porque elas não existem mais, a não ser na mente), mas que destruísse qualquer sentimento ruim que possa acompanhar tais lembranças. Reviver um passado nefasto é como tomar veneno. Que essas lembranças não possam ser “revividas” em minha mente, mas que sejam somente um sopro na memória, um vento que não traz cheiro, um relembrar sem reviver, um sentir sem ressentir, um lembrar sem desejo de esquecer, uma lembrança que traga consigo a compreensão de que nada nesta vida é por acaso. Cada passo foi necessário e carregado de propósito, trazendo-me até aqui, a este momento de meditação e encontro comigo mesma. Eu me amo mais hoje do que ontem. E amor-próprio é tudo! É amando a mim mesma que eu amo o Deus que habita em mim. E, assim, posso levar este amor aos outros. Que Deus permita que eu possa transbordar de amor o meu espírito. “Que todo aquele que se aproximar de mim sinta a Sua presença, Deus.” Estou no caminhar... um dia, neste tempo ou em outro qualquer da existência da minha alma, em vida terrena ou extraterrena, eu chegarei lá, alcançarei a paz suprema que nada pode abalar, se Deus quiser.
Que venham larvas e borboletas, que venha a chuva, o outono, o inverno, a primavera e o verão. Que eu possa me sentir cada vez mais forte a cada acometimento e re-desabrochar a cada amanhecer. Porque é nos momentos de fraqueza que a força interior pode emergir em seu maior vigor. Se hoje não há nada acontecendo que seja tão ruim e que eu queira destruir, nada sei a respeito do futuro. Então, o que mais posso querer é que eu saiba lidar com paz, serenidade e sabedoria com as surpresas do caminho e que eu saiba esperar ou agir, conforme a necessidade, administrando bem a ansiedade, libertando-me de qualquer angústia. E que eu possa reconhecer a primavera e aproveitá-la, todas as vezes em que ela chegar em minha vida. E, se eu me perder, que eu saiba me encontrar. O grande segredo para isso (descobri por mim mesma) é um só, simples e clichê, mas verdadeiro: que eu me lembre sempre que não há percursos lá fora que possam me levar à felicidade, o caminho está aqui dentro de mim.
“Aquele que não consegue suportar o que é mau não vive para saber o que é bom." (Provérbio judeu)
Namastê.
Autora: Gizele Toledo de Oliveira (direitos autorais reservados).
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